domingo, 18 de setembro de 2011

Dormir para lembrar só o que realmente importa?

Aproveitando o sábado cinzento em Curitiba e a inspiração para escrever, comentarei aqui um dos meus artigos favoritos.

Todos sabemos que é impossível lembrar de todos os eventos que experienciamos certo? Também sabemos que quando dormimos realizamos a consolidação do que aprendemos enquanto acordado. Mas por que será que depois de uma boa noite de sono lembramos apenas uma parte do que aprendemos no dia anterior nos dias anteriores?

Uma possível resposta é bastante simples: porque não há espaço, nem energia, para tudo.
Outra resposta seria que o sono atua como um filtro consolidando arquivando só o que realmente importará no futuro. É o que mostra o estudo "Sleep selectively enhances memory expected to be of future relevance" (O sono seletivamente melhora memórias de relevância futura). O grupo de pesquisadores alemães coordenado pelo neurocientista Jan Born ensinou uma série de lista de palavras para sujeitos que após aprenderem foram informados que seriam testados sobre estas listas após o sono. Outro grupo aprendeu a mesma lista mas não foi informado de que seria testado após o sono. Havia também grupos que aprenderam a tarefa e não puderam dormir antes do teste, um deles ficou sabendo que seria testado e outro não.

O que aconteceu é que o grupo que dormiu e tinha a expectativa de ser testado teve o melhor desempenho entre todos os grupos. A figura acima retirada do artigo original apresenta o desempenho dos sujeitos para o teste, em preto o desempenho dos sujeitos dos grupos com a expectativa e em branco sujeitos que não esperavam ser testados. Mais interessante ainda é a figura ao lado que mostra apenas três grupos. Ali estão organizados os dados dos sujeitos que deveriam fazer parte do grupo sem expectativa de teste, porém, esses sujeitos desconfiaram que seriam testados, portanto, formaram um novo grupo. Note que apenas os sujeitos que desconfiaram e dormiram tiveram uma melhora significativa no desempenho.

Não contentes com essas informações os pesquisadores foram além e testaram o mesmo desenho experimental usando outros tipos de teste. Fizeram o mesmo para uma tarefa de discriminação visual de 2 dimensões (jogo da memória!) e obtiveram o mesmo resultado. Testaram memória não declarativa, através de um teste de digitação de sequência e o resultado foi o mesmo. O sono ajuda a consolidar seletivamente memórias que serão relevantes no futuro!

Esse trabalho é mais uma evidência importante para o papel do sono na consolidação da memória e mostra que o sono participa ativamente nesses processos.

Acho que está na hora de juntar as teorias da Homeostase Sináptica com o Processo ativo de consolidação.

Referência:

Wilhelm IDiekelmann SMolzow IAyoub AMölle MBorn J. Sleep selectively enhances memory expected to be of future relevanceJ Neurosci. 2011 Feb 2;31(5):1563-9. 

"Ideias a mil"

2 comentários:

  1. Interessante seria testar a duração dessa memória. Se o teste fosse depois de alguns dias, o efeito continuaria?

    []s,

    Roberto Takata

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  2. Roberto,

    a ideia de testar o efeito depois de alguns dias é ótima, tenho visto poucos estudos avaliando o efeito do sono na manutenção de memórias ao longo dos dias, e até agora não vi nada que considere o efeito de relevância seletiva ao longo do tempo.
    Vale a pena testar.

    Um abraço.

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